Os cavalos estão inseridos na ordem dos Perissodátilos, ou seja, mamíferos ungulados de grande porte, com membros locomotores bastante desenvolvidos, que são envoltos por casco córneo e possuem estômago simples.
Se analisarmos estas características, já podemos perguntar como um animal de grande porte, com um aparelho locomotor desenvolvido para suportar bem seu estado corpóreo, é dotado de um estômago simples? Quase todos os outros grandes herbívoros são ruminantes.
Foto: Equus Magazine
Fisiologia Gástrica
No caso dos equinos, especificamente, vemos estas características como uma grande preocupação para os especialistas. Para manter sua saúde, um animal necessita diariamente de grandes quantidades de energia, as quais são encontradas principalmente nos concentrados, portanto é preciso levar em conta sua fisiologia gástrica, que engloba este tão problemático estômago.
A úlcera gástrica é uma doença muito comum, cujas causas muitas vezes são desconhecidas. Porém, apresenta favorecimento por fatores psíquicos ou pode ser desenvolvida pelo uso excessivo de medicamentos que irritam a mucosa gástrica.
Esta patologia pode acometer equinos de todas as idades, desde um animal idoso até um potro. Cerca de 90% dos cavalos de corrida, 70% dos animais em hípicas e 25% dos potros são portadores de gastrites ou úlceras gástricas de maior ou menor gravidade.
Duas pesquisas realizadas em Kentucky, Estados Unidos, descobriram que 22 a 30% de todas as mortes de potros se deviam a úlceras gástricas, acometendo principalmente potros de até quatro meses de idade.
Principais causas
Verificou-se que lesões de úlceras gástricas são maiores nos cavalos atletas e nos cavalos acometidos por distúrbios clínicos. Sendo o estresse considerado um fator importante no seu desenvolvimento, o qual debilita os mecanismos de defesa da mucosa gástrica contra as ulcerações causadas pelos ácidos gástricos.
Além do fator estresse, considera-se também a administração – principalmente oral – em quantidades altas ou por períodos longos de drogas anti-inflamatórias não-esteroidais como um fator desencadeante da doença, porém não tão frequente como o estresse.
Alimentações ricas em proteínas e grãos fornecidos na forma de ração resultam em uma incidência mais alta de úlceras, mas não há dados bastante convincentes quanto ao papel prejudicial das proteínas no estômago.
Constatou-se que o fornecimento de grãos aumenta a secreção de ácido gástrico quando se compara ao fornecimento somente de feno; enquanto o acesso livre ao volumoso resulta em menor acidez, quando comparado ao fornecimento de algumas refeições ao dia.
Também, enquadrado neste critério, observou-se que equinos com uma alimentação livre em forma de pastejo apresentam menos ulcerações gástricas que equinos mantidos em uma baia.
Tanto o jejum como as rações ricas em grãos predispõem ao aparecimento de úlceras gástricas nos equinos e o consumo frequente de nutrição rica em forragem pode ajudar a evitá-las.
No potro, desde o nascimento até cerca de três meses de idade, a acidez gástrica aumenta com a ausência de consumo alimentar sólido. E, consequentemente, predispõe o recém-nascido a desenvolver as úlceras gástricas que podem levar ao risco sua vida, a qual ainda se apresenta frágil neste período.
Devido a este fator, a estimulação do potro para uma alimentação sólida mais precocemente pode ser útil para se evitar esta doença. O colostro e o leite da égua contêm substâncias que potencializam a proteção da mucosa gastrointestinal frente às ulcerações. Havendo duas vezes mais no colostro (primeiro leite) do que no leite da égua. Isso demonstra a importância do colostro para o bom desenvolvimento do potro.
Doenças infecciosas ou parasitárias já foram citadas como causas de úlceras gástricas; no entanto, elas podem ser secundárias em animais que já apresentavam a doença por outro fator. Vale lembrar que os parasitas não se fazem presentes na maioria dos casos de úlceras.
Além do fornecimento precoce de volumoso e do colostro, e do bom controle parasitário, o programa de vacinação controlado, o estresse com isolamento, maus tratos, alterações bruscas de temperatura, enfermidades e com os transportes, entre outros, devem ser minimizados, sendo fatores essenciais para o controle das úlceras gástricas em potros.
Sintomas
As úlceras podem se apresentar na forma subclínica, clínica, perfuração e obstrução devido à cicatrização. A forma subclínica não apresenta nenhum sintoma aparente, mas pode levar a uma queda do desempenho físico do equino.
São úlceras visíveis endoscopicamente, cicatrizando-se sem nenhum tratamento na maioria dos casos. Quando na forma clínica, os sintomas mais comuns são: diarreias, apetite deficiente, perda de peso, debilidade física, uma aparência de ventre abaulada e cólica geralmente com fezes líquidas.
Nos potros, também podem ocorrer salivação excessiva e espumação, ranger dos dentes, distensão gástrica, regurgitação de leite e febre, pois as úlceras proporcionam a entrada no corpo de microrganismos, resultando em infecção generalizada.
Constata-se grande incidência de casos de mortes em potros devido à perfuração das úlceras, resultando em peritonite difusa severa, acompanhada de dor abdominal aguda, febre e choque, levando ao óbito em poucos dias.
Inicialmente o animal demonstra depressão profunda, seguido de aumento da frequência cardíaca e respiratória, membranas mucosas tóxicas e grande distensão abdominal.
Diagnóstico
Embora em muitos casos não possuam sintomas aparentes, pode-se suspeitar de úlceras gástricas quando equinos apresentarem sintomas como: cólica, diarreia, perda de apetite, ranger dos dentes, salivação excessiva, sensibilidade à palpação no abdômen.
O diagnóstico definitivo da Síndrome da Úlcera Gástrica Equina ocorre somente através da gastroscopia, ou seja, da inspeção da porção interna do estômago através do uso de equipamento vídeo-endoscópico.
O exame é realizado com o animal em estação, em geral levemente sedado, quando o endoscópio é introduzido pela via nasogástrica e alcança o estômago para sua visualização completa. Uma vez dentro do estômago, avalia-se toda a região glandular, principal sede de alterações erosivoulcerativas.
Para este exame há a necessidade de que o equipamento tenha 3 metros de comprimento, com a finalidade de se realizar a retroflexão e observar-se todo o interior do estômago.
Tratamento
Como as úlceras gástricas muitas vezes se ocultam no animal, é de grande valia o acompanhamento dos equinos pelo médico veterinário, a fim de se diagnosticar precocemente a doença, facilitando o tratamento e poupando o animal de possíveis complicações.
Após de concretizado o diagnóstico de úlceras gástricas, deve-se observar qual ou quais os fatores que levaram à doença e iniciar o tratamento de acordo com a gravidade do caso. A resposta ao tratamento parece ser melhor quando o equino repousa e tem acesso livre à forragem durante a terapia.
O uso de antagonistas de receptores H2 normalmente mostra-se efetivo apenas quanto à remissão dos sintomas clínicos, não sendo tais produtos eficazes, como demonstrados por diversos trabalhos clínicos, quanto à cicatrização das úlceras analogamente aos antiácidos.
O omeprazol, além de comprovadamente eficaz na cicatrização de úlceras gástricas, ainda mostra-se bastante efetivo na recidiva da síndrome, mesmo em casos de animais que continuam expostos a condições ulcerogênicas severas (como estresse, treinamento intenso, enfermidades, transporte etc.).
É importante salientar que diversos trabalhos científicos, aferidos pelo exame vídeo-endoscópico da porção interna do estômago, demonstram claramente que uma série de formulações genéricas em grânulos entéricos de omeprazol não são efetivas ao tratamento de úlceras gástricas. Principalmente pelo fato de que são facilmente “quebradas” pelo baixo pH do estômago.
Alguns produtos em pasta têm formulação que favorece a absorção do princípio ativo sem que o mesmo seja alterado pelo processo digestivo. Uma dosagem indicada de omeprazol é de 4 mg/kg/dia para o tratamento de úlceras e 2 g/kg/dia para a prevenção das recidivas, durante tempo de tratamento a ser definido pelo médico veterinário.
A administração de antiácidos é bastante benéfica no alívio dos sinais clínicos, particularmente do apetite deficiente e da cólica suave, mas é ineficaz na cicatrização.
O uso de bicarbonato de sódio tem ação curta e tende a causar uma alcalose, não sendo de grande valia no tratamento. Em alguns casos, mesmo sem a administração de drogas, o repouso no pasto resulta em uma cicatrização das úlceras gástricas dentro de poucos meses. Mas, se não forem eliminados os fatores desencadeantes (como estresse), claramente ocorre a recidiva mais grave da doença.
Conclui-se que as úlceras gástricas podem ser consideradas como um mal secreto que atinge uma grande porcentagem dos equinos mantidos em regime intensivo. Ou seja, criados em baias e que devem ser diagnosticada precocemente, a fim de se evitar queda de desempenho ou manifestações dos sintomas já em uma fase grave da doença. Além de se manter profilaxia com manejo adequado desde as primeiras horas de vida, proporcionando melhor desempenho e bom desenvolvimento destes tão complexos animais, os cavalos.
Procure sempre um médico veterinário para obter um diagnóstico correto para realizar um tratamento efetivo,
Fonte: Editora Passos / Cavallus