segunda-feira, 18/novembro/2024
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Será possível aumentar o índice de fertilidade das éguas?

Chega a estação fria e com ela a ‘estação de monta’. Mas por que isso acontece? E se quisermos cobrir nossas éguas em qualquer época do ano? As respostas para estas dúvidas têm razões técnicas tanto quanto econômicas ou mesmo práticas. Também é preciso levar em conta a grande diversidade climática e geográfica de nosso país.

Muitas destas explicações estão inseridas na área de conhecimento chamada de bioclimatologia, ou seja, o estudo da correlação que o clima tem com os ciclos vitais de animais e plantas. E, claro, o estudo do clima pertence ao campo da geografia. Juntando algumas pitadas de biologia, já podemos seguir adiante.

A primeira informação a ter em mente é que as éguas são ‘poliéstricas estacionais’. Isto significa que elas têm ciclos estrais periódicos, durante mais ou menos metade do ano. Vale lembrar que toda regra tem exceção e dúvidas ou problemas precisam ser atendidos por um médico veterinário capacitado em reprodução de equinos.

Mas, aproximadamente, o ciclo estral das éguas ocorre em intervalos de 21 a 25 dias. A égua fica fértil durante três a cinco dias, depois ocorre um intervalo de 18 a 21 dias. E assim sucessivamente, durante a primavera, verão e início de outono.

Durante o inverno e nos períodos de transição, ela não cicla ou tem cios fracos, considerados subférteis, por vezes anovulatórios (quando a égua apresenta algum comportamento de cio, porém não chega a liberar um óvulo para possível fertilização).

É elucidativo visualizar estas duas épocas do ano, estro e anestro (= presença e ausência de cio), como duas ondas, com picos negativos e positivos de fertilidade. E os períodos de transição (quando a égua está entrando em anestro ou saindo dele) são os de fertilidade intermediária. Se fizermos uma superposição deste ciclo com um calendário, veremos que, no hemisfério Sul, o pico de fertilidade das éguas corresponde ao mês de outubro. Por que isto acontece?

Ao contrário do que muitas pessoas pensam, o fenômeno do anestro não tem relação direta com a temperatura ambiente e sim com o fotoperíodo, que é a quantidade de luz solar que incide naquele local em 24 horas. No verão escurece tarde e amanhece cedo, no inverno é ao contrário.

A geografia nos ensina que, quanto mais próximos estamos dos polos, maior a diferença entre fotoperíodo de verão e de inverno. Seja no polo norte ou no sul, no verão polar há o sol da meia-noite, quando o sol nunca se põe. Já no inverno o sol nunca nasce. No equador, em todos os 365 dias do ano, há doze horas de claridade e doze horas de período noturno.

Tal como na maioria dos mamíferos, o mecanismo endócrino dos equinos reage ao aumento ou ao decréscimo do fotoperíodo numa cadeia hormonal que inibirá ou estimulará a produção dos hormônios reprodutivos, principalmente do feedback progesterona x estrógeno.
fertilidade de suas éguas

Ainda dentro dos termos que pertencem à geografia mais do que à medicina veterinária, os solstícios são os dias do ano mais longo (de verão) e mais curto (de inverno). Entre eles, há os equinócios de primavera e de outono, em que, tal qual no equador, há luz durante exatas doze horas. E, não por coincidência, estas são as datas das mudanças de estação.

Assim, em datas aproximadas, para o hemisfério Sul:

    22 de março: equinócio de outono
    22 de junho: solstício de inverno
    22 de setembro: equinócio de primavera
    2 de dezembro: solstício de verão

De modo que mais ou menos no começo de fevereiro as éguas vão ficando menos férteis, com cios menos pronunciados e mais curtos. Sua hipófise já está reagindo ao progressivo encurtamento dos dias.

Por experiência ou conhecimento técnico, todas as pessoas experientes, nos haras, sabem disso, e é por isso que ‘bate o desespero’ para emprenhar aquelas éguas que ainda chegam a janeiro vazias.

O anestro em si dura do fim de março até junho, e o pico de fertilidade das éguas se dá no mês de outubro, fenômeno também bem conhecido por todos que já tenham trabalhado ou estagiado em um criatório.  Contudo, nas zonas tropicais a ocorrência do anestro é tanto menos caracterizada quanto mais próximos estivermos do equador.

No Brasil, isto significa que na região Sul – para baixo da linha de Sorocaba e Campinas, onde passa o Trópico de Capricórnio – as éguas costumam ter períodos de estro e anestro bem caracterizados, enquanto perto da linha do equador muitas delas nem têm anestro, ciclando o ano inteiro. E para o Brasil Central a resposta é ‘depende’, incluindo desde fatores genéticos a nutricionais, e também da maneira como o manejo reprodutivo é conduzido no criatório.

Mas tudo na natureza ocorre em ciclos. A alternância entre anestro e estro nada mais é do que uma possibilidade para que o organismo entre em descanso fisiológico, e que o potro seguinte nasça mais forte e bem formado. O mais tardar neste ponto é que devemos começar a pensar se um excesso de manipulação por meio da biotecnologia pode trazer prejuízo à qualidade de animais de nosso criatório.

De fotoperíodo artificial a tratamento hormonal, já existem muitas possibilidades de manter as éguas ciclando o ano inteiro – e, conforme explicado acima, em algumas regiões do Brasil elas irão ciclar naturalmente mesmo. Mas se o aparelho reprodutor entrar em exaustão fisiológica, as consequências podem ser potros menores e menos resistentes, ou ainda quebra na produção de leite – tanto no caso das matrizes (mães biológicas) quanto das receptoras (barrigas de aluguel), das quais ainda falaremos mais para frente.

Aqui como em quase tudo na vida, é necessário buscar o equilíbrio entre quantidade e qualidade.  A antiga máxima de “dois potros a cada três anos” pode ser válida, ainda que haja éguas que nos brindam com um potrinho a cada doze meses, relojinhos reprodutivos, sempre gordinhas e boas leiteiras. Mas aqui a chave está na predisposição individual, não na ‘forçada’ artificial.

Curiosamente, o ciclo hormonal acontece também com os garanhões, ainda que em menor intensidade. Isto foi verificado em garanhões PSI destinados a acompanhar a estação de monta tanto no hemisfério norte quanto no sul. Já que nesta raça a única forma aceita de reprodução continua sendo a monta natural, ao término de uma temporada os sementais eram (e em alguns casos ainda são) embarcados para servir as éguas na outra metade do globo, com a intenção de maximizar a produção destes valiosos animais.

Passariam, por exemplo, seis meses do ano na Inglaterra e os outros seis na Austrália, ou ainda poderiam se alternar entre Brasil e Estados Unidos. Em tese, vivendo apenas no verão, a hipófise estimulada por longas horas de incidência de luz solar, os garanhões teriam contínua produção elevada de sêmen de boa qualidade.

Só que na prática, a partir do segundo ano a fertilidade e até a libido destes garanhões começava a decair. É que a eles não era permitido o descanso fisiológico sazonal, correspondente ao comportamento natural da espécie.  Isto também pode servir de alerta sobre o uso excessivo ou mal direcionado do fotoperíodo artificial em éguas, por exemplo, pretendendo que elas comecem a ciclar muito antes do que seria natural. E vale também para os casos de importação de matrizes e reprodutores de um hemisfério a outro: é natural que eles sejam sub- ou até inférteis durante o primeiro ano de suas novas vidas.

Por Claudia Leschonski, MV
Fonte: Editora Passos
Fotos: commons.wikimedia

Fonte: Cavallus / ABCCH

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